O dia em que o Vinte de Setembro desabou

Em minutos, lá se foi a Revolução

21 Setembro 2020 | Segunda-feira 20h37

Publicado em 20 set 2012
 
Há dois anos, passei pela primeira vez o feriado gaúcho de Vinte de Setembro em Porto Alegre. Foi uma emoção após outra. Fazia uma tarde ensolarada e quente, prenunciando a primavera. Nas ruas, crianças voltavam com os pais das comemorações. As meninas vestidas de prendas, os meninos pilchados. Que festa!
 
Com o aniversário de uma amiga à espera, meu filho e eu tomamos um táxi no Partenon rumo à Borges.

Em cada semáforo, o colorido das roupas típicas fazia reluzir a alma gaudéria. "Coisa mais linda", murmurei.
 
Até que num cruzamento movimentado, minha atenção foi fisgada por um cavaleiro. Trajado ao rigor da data, deixava que o cavalo trotasse sem pressa enquanto ele, debaixo daquele sol e do chapéu, sorvia uma latinha de cerveja.
 
"Nossa!", exclamei. "Aquele ali só vai chegar em casa hoje porque o cavalo sabe o caminho."
 
Meu filho riu, o taxista ouviu, mirou o farroupilha mamado e iniciou uma digressão espantosa.
 
"Este feriado só atrapalha o nosso trabalho", começou. Olhou para um táxi estacionado, reconheceu o colega e perguntou: "Como é que tá hoje?" O amigo limitou-se a virar o polegar para baixo.
 
"Estão vendo?", retomou ele a conversa. "Este feriado é uma merda pra nós. Esse pessoal só quer saber de farra. Nem sabem o que estão comemorando. Faz uma semana que tão enchendo a cara lá no parque e anteontem esfaquearam um. Mataram o cara!", disse elevando a voz.
 
O tom seguiu alto, os termos em franco declínio. "Maloquerada dos diabos! Fazem festa como se tivéssemos ganho alguma coisa. O Rio Grande virou um país independente por acaso? Nossa economia melhorou? Então estão comemorando o quê?" E pra encerrar, esbravejou: "Nós perdemos, porra!!!"
 
Chegamos à Borges. Paguei sem dizer uma palavra. Saímos à calçada e pedi a meu filho Luca que me desse um tempo. "Estou atônito", desabafei. "Perplexo. Nem sei o que dizer. Em cinco minutos, esse taxista demoliu 10 anos de revolução!"
 
Filho de gaúcha, Luca também acusou o golpe. Tocou-me no ombro num gesto de solidariedade e apontou a porta do prédio. A aniversariante nos esperava.
 
Meu primeiro Vinte de Setembro em Porto. Que coisa, tchê!
 
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