Três tiros, o fim de Suzy

Há 45 anos, crime chocou Centro de Criciúma

15 Abril 2021 | Quinta-feira 15h33

Os moradores da Rua Araranguá mal haviam sentado à mesa quando três estampidos interromperam o almoço. Os tiros à queima-roupa não deram a mínima chance a João dos Santos, um ex-sacristão na Igreja Matriz São José pouco conhecido pelo nome.

Suzy, apelido que o tornou figura pública, é lembrado até hoje como o primeiro homossexual a chutar a porta do armário em Criciúma e protomártir da comunidade LGBT & Cia local. Morreu jovem, 27 anos, na frente de sua casa às 12:20 do dia 26 de abril de 1976.

Rua Araranguá
Ele conversava com outra celebridade de então, o fotógrafo Juca, quando o eletricista Sebastião Lemos, 43 anos, estacionou seu fusquinha e o chamou. Ao se aproximar da porta do motorista, foi alvejado no nariz, atrás do ouvido e no tórax, este último o projétil fatal.

Com exceção da atividade religiosa, as informações acima foram capa do semanário O Independente. "Em 1960 e 61, ele era chefe do nosso grupo de coroinhas e nos escalava para as missas", revela o colunista Sérgio Martins, o Pinduka. "Mocinho, foi nosso primeiro gay assumido."


Suzy morava com os pais numa das casas da antiga Cpcan (Comissão do Plano do Carvão Nacional) na Rua Araranguá. "O pai dele era funcionário da autarquia federal e a família ocuparia o imóvel até a sua aposentadoria", conta Pinduka.

Surpreendido pelos balaços, Suzy correu para o outro lado da rua e tombou no pátio da frente de uma casa. Morreu ali em poucos segundos. "A necropsia apontou perfuração pulmonar seguida de uma hemorragia aguda", detalha o colunista.

"Estávamos esperando um mano pra almoçar e ouvimos os tiros", lembra o gráfico aposentado Kaio Machado, na época residente a poucos metros na Rua Urussanga. "Fomos pra fora e vimos a correria toda. Mataram o Suzy, comentavam."

Um cheque sem fundos e insultos à esposa foram as motivações apontadas pelo autor dos disparos, mas no júri realizado em 29 de outubro de 1981 a razão foi outra. A vítima estaria aliciando uma filha adolescente do eletricista para a prostituição.

Após 11 horas, os jurados acataram a tese da "integridade do lar e da unidade da família" formulada pela defesa e absolveram Sebastião. "Esta foi a primeira vez que se sustentou referida tese em nosso estado", registrou o semanário Tribuna Criciumense.


"Os tempos eram outros e a legítima defesa da honra era largamente aceita", assinala o advogado Paulo Moura Ferro, contratado pelo réu e hoje com 60 júris no currículo. "Optei por essa linha para evitar possíveis confrontações nas instâncias superiores."

"Suzy era divertido e inteligente, tinha resposta pra tudo", define o ex-vizinho Kaio. "Conversava sempre com ele e creio que era discriminado porque não estávamos preparados para conviver com a situação. Ele estava muito além da nossa inteligência." 

Agradecimentos
Rosana Guimarães Correa
Marilei Rodrigues Corrêa / Arquivo Histórico Pedro Milanez - Criciúma


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