As eleições passam, nós ficamos

Com esperanças, sonhos, frustrações e consequências

29 Outubro 2018 | Segunda-feira 17h30

Comecei a votar há 44 anos. Não me dei ao trabalho de contar a quantos pleitos compareci. Na média, quatro por década, além dos segundos turnos. Daí me sentir rodado o suficiente para alimentar convicções. 

A primeira delas é a de que as eleições passam, mas nós ficamos. Com esperanças, sonhos, frustrações, alegrias, resultados, consequências e - pelo que leio e ouço desta vez - com menos amigos/as.

A mais inquietante de minhas certezas, no entanto, é a de que nada representa melhor uma nação do que seu povo e nada representa melhor um povo do que os políticos que ele elege.

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As redes sociais (sic) fizeram a diferença nessa campanha? Foram decisivas para definir a eleição presidencial? Não creio. 

Os grandes cabos eleitorais de Bolsonaro foram o assaltante no portão de casa, o assassino que matou para levar um celular, o bandido que explodiu o caixa eletrônico, a filha que matou a mãe, as gangues que renderam famílias em casa, os ex-maridos que fuzilaram as ex-esposas e os alunos que agrediram professores em sala de aula. 

Cada reportagem em telejornal, cada boletim de rádio, cada notícia em jornais e portais capitalizou a revolta de uma população indefesa. Desarmada e perplexa com uma legislação ineficaz, ela reagiu nas urnas contra aqueles que a abandonaram.

E as redes sociais? Elas colocaram a cereja no bolo do candidato que soube compreender e vociferar contra tanta barbaridade. Mais que desabafo, as comemorações que tomaram as ruas na noite de domingo viraram catarse coletiva.

Nem aí para o tal horário eleitoral, o bom e velho rádio e a vetusta televisão mais uma vez deitaram e rolaram.


Jair Bolsonaro sobreviveu a um atentado a faca em Minas que ainda pode lhe carrear sequelas e enfrentou três duros adversários: seu virtual ministro da Economia, Paulo Guedes, seu vice, general Mourão, e seu filho Eduardo.

Calados seriam aliados. Falantes converteram-se em fogo amigo.

Bolsonaro cravou 57 milhões de votos (55% dos válidos), um baita patrimônio político. Historicamente, as luas de mel de governantes com o eleitorado duram de três a seis meses. O prazo depende mais da coerência do que dos holofotes.

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Já o candidato do Partido dos Trabalhadores entrou na campanha como "poste" e saiu como Fernando Haddad com 47 milhões de votos, cerca de 45% dos válidos.

Com mais duas semanas de campanha, é improvável que vencesse a disputa, mas reduziria muito a diferença de domingo. Equivalente, como se viu, à soma dos votos brancos e nulos com as abstenções.

Haddad perdeu a eleição, mas despediu-se das urnas como destinatário de sentimentos e resignações. Numa campanha - registre-se - em que ouviu cobras e lagartos, inclusive de aliados.

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As eleições passam, nós ficamos e se algo dá errado basta apontar os culpados de sempre: eles, os políticos.

Esses seres estranhos que ninguém lembra de onde vêm, mas que todos sabem - refrescada a memória popular - que são tudo farinha do mesmo povo.

Imagem / cortesia: Emerson Justo / Satc

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